domingo, 14 de dezembro de 2008

Mensagem

Meus caros,


Nos últimos dias talvez tenham visto notícias sobre os protestos em Atenas e noutras cidades gregas, que foram despoletadas pelo assassínio de um rapaz de 15 anos por um polícia.


Tenho quase a certeza que a maioria de vocês, e consigo perceber que assim seja, não se interessa assim tanto sobre os problemas sociais da Grécia.


Mas, por outro lado, tenho quase a certeza que se interessam, sim, pela qualidade das notícias que recebem do resto do mundo.


E, se esta qualidade estiver reflectida na recente “análise” da situação pelos meios de comunicação social internacional, como Malcolm Brabant da BBC (http://news.bbc.co.uk/1/hi/world/europe/7771628.stm) ou John Carr no Times, então lamento mas a qualidade é frustrantemente baixa.


Ao ler estas notícias, podíamos ficar com a ideia de que os recentes acontecimentos na Grécia têm como base uma vaga tendência “histórica” dos gregos de se rebelarem contra a autoridade – como se os manifestantes furiosos e os cocktais Molotov atirados às esquadrsas nas últimas noites estivessem de alguma maneira directamente relacionados com a cultura de guerra dos Espartanos ou até, segundo a opinião fundamentada de John Carr, com as guerras dos Troianos.


Mas, para além da Terra dos Esteriótipos existe também um lugar chamado mundo real.


E, neste mundo, a polícia grega pode ser ilibada de tudo, incluindo, literalmente, assassínio. Uma e outra vez. Eles podem espancar imigrantes em estações de polícia, sem que ninguém seja acusado ou detido. Eles são autorizados, aliás encorajados, a nutrir uma atitude baseada na força e na violência para e com os cidadões.


Neste mundo, os gregos sofrem ironicamente de uma elite política e económica corrupta, que, nos últimos anos, esteve constantemente ligada a escândalos de dinheiro público e até terra pública; elite esta que, no entanto, se recusa, sem vergonha, a sequer pedir desculpa, muito menos a aceitar reformas.


Neste mundo, quase todos os gregos com menos de 25 anos sabem que pertencem ao que é chamado por todo o lado como “a geração 700 euros”, a primeira geração depois da segunda guerra mundial que cresce com a certeza que vai viver uma situação pior que a dos seus pais. Uma geração com poucas perspectivas de um futuro melhor e ainda menos esperança nesse futuro.


É neste mundo – e não no mundo dos comentadores com inclinações arqueológicas – que uma única bala pode incendiar uma raiva que tinha vindo a crescer num ritmo constante nos últimos anos; e, numa nota positiva mas cautelosa, a incendiar também uma alma pública, de que tanto se precisa, à procura de um país.


Claro está, não faz sentido pedir-vos que façam alguma coisa por isto. Mas faz sentido pedir-vos que façam alguma coisa.


A próxima vez que lerem sobre “protestos sem sentido” noutro país, por favor, parem por um segundo a pensar no que o olho jornalístico é incapaz de ver.


E, por favor, lembrem-se que as pessoas não queimam as suas próprias cidades só porque têm mau humor nacional.


Obrigado pela vossa atenção e bom ano novo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário